Dr. Bernardo de Gregório.
"Permita
Que o amor
Invada sua casa,
Coração"
"A Sombra da Maldade", Cidade Negra
Toni Garrido e Da Gama
O Mal parece insistir em habitar a alma humana ao longo de tantos milênios de História e parece mesmo ter se tornado a marca registrada da Humanidade. O que é o mal? De onde provém? Como eliminá-lo de nossas vidas? A resposta a essas questões não é nem um pouco simples de ser encontrada e sua busca ronda a mente humana há tanto tempo quanto o próprio Mal e constitui uma matéria de interesse chamada Ética. Neste campo, Platão nos narra em seu texto "Apologia a Sócrates" que este afirmou que "ninguém faz o Mal deliberadamente, se o faz, é por ignorância". Aquele que conhece a Ética, e ela só se deixa conhecer através da Razão, jamais teria o direito de praticar o Mal, ou até pior: não se consegue praticá-lo se se tiver plena consciência de sua existência.
Aristóteles define em seu livro "Ética a Nicômaco" que qualquer Ser Humano tem um grande e único objetivo em sua vida: ser feliz. O grande problema é que cada um de nós, erroneamente, elege um meio pelo qual pretende atingir no futuro esta felicidade. Uns imaginam que seria através de riquezas; outros, pelo poder; outros ainda pelo prazeres sensórios ou pelas paixões. Todos erram pelo simples fato de que a felicidade não repousa jamais num futuro que seria atingido através de um certo meio. A felicidade é dada e habita inequivocamente o momento presente, tenhamos nós riquezas ou não, poderes ou não, prazeres e paixões ou não; aliás, normalmente ela está afastada destes itens.
Na tradição judaico-cristã se tem o conceito de Sete Pecados Capitais. Aqueles que os cometerem estarão condenando suas almas ao inferno. Na verdade, esta é apenas uma maneira antiga de apontar os sete erros mais comuns que as pessoas cometem em sua busca pela felicidade. São eles: a ira, a inveja, a preguiça, a soberba, a gula, a avareza e a luxúria. Estas são as paixões que seduzem e põem a perder a felicidade humana. Não que nós não tenhamos todos e cada um deles bem lá dentro de nossas almas: isto é normal e saudável, mas o pecado capital é entregar sua vida ilimitadamente a uma destas paixões. Como podem estes pecados capitais serem saudáveis? Bem, os nomes adotados para definir estes pecados são em si superlativos, ou seja: se tivermos no lugar da ira, apenas raiva expressa de maneira canalizada e dirigida para nossa auto-proteção; em vez de inveja destrutiva tivermos o que eu chamo de "inveja positiva", que na verdade é admiração; se em troca da preguiça adotarmos apenas o relaxamento e a despreocupação; se substituirmos a soberba por um orgulho de si, por um amor próprio; se houver nutrição e sabor no lugar da gula; ponderação no lugar da avareza e prazer no lugar da luxúria, nossas almas estarão salvas e saudáveis e estaremos mais perto da felicidade.
Estes "pecados", estas paixões, na verdade existem em nós como resquícios de instintos animais muito claros. O problema é que nos animais estes instintos são regidos por forças naturais equilibradoras dadas pela restrição de oferta e pela lei da seleção natural. No Ser Humano, devido ao advento da consciência e dos meios de produção, estas forças naturais foram minimizadas ou de alguma forma contornadas. Eis o Pecado Original: o fruto da árvore do conhecimento do Bem e do Mal. Na nossa sociedade então, a anulação de tais forças naturais chegou a um nível jamais visto antes. Em decorrência, o extravio da felicidade também. Nossa sociedade não é mais má do que foram as sociedades anteriores, porém exerce sua maldade com maior eficiência. Igualmente nossa sociedade não é menos feliz do que foram as suas predecessoras, mas espera uma quota de felicidade muito maior e, geralmente, de alguma fonte que jamais poderá supri-la.
Somos todos malvados e infelizes, tendo nas mãos, paradoxalmente, instrumentos que jamais a Humanidade teve para ser mais feliz do que nunca. Se pensarmos que atualmente um terço da Humanidade passa fome e vive abaixo da linha da pobreza e se somarmos a este fato a informação de que outro terço da mesma Humanidade sofre com doenças provocadas pela obesidade, teremos uma idéia do que eu estou dizendo. Santo Agostinho não admitia a existência do Mal. Isto porque ao admiti-lo teria que forçosamente admitir que o Mal foi criado por Deus, uma vez que é o Criador absoluto do Universo. Sendo assim lançou mão de um conceito duvidoso: o chamado Privatio Boni, ou seja, a ausência do Bem. Deus é Bem supremo, mas permite a cada um a liberdade de aceitá-lo ou não. Aqueles que o rejeitam se condenam a uma situação de desgraça e vivem na "ausência do Bem", o que é comumente chamado de "mal". Muito tempo mais tarde, o Psiquiatra e Filósofo suíço Carl Gustav Jung rejeitou este pensamento, entendendo que o mal existe por si e com certeza faz parte da alma humana. Jung ironiza dizendo que quem preferir, pode chamar o mal de "ausência do Bem", mas isto não altera sua essência.
O Mal é tudo o que está guardado e reprimido em nós, o Mal são as paixões, o Mal é não perceber o Outro, o Mal é o nosso medo do futuro, o Mal são os monstros de nossos pesadelos, o Mal são as catástrofes naturais. Ao conjunto de tudo o que é mau e habita nosso Inconsciente, Jung deu o nome de "Sombra". Sobre este tema, sua discípula e amiga, a psiquiatra Marie-Louise von Franz escreveu o livro "A Sombra e o Mal nos Contos de Fada", onde demonstra, através de estórias e mitos milenares, a existência do Arquétipo do Mal. Porém, neste livro compreendemos que o mal não é vão, o Mal existe para mostrar-nos, por contraste, a existência do Bem. O que seria de uma estória que falasse de uma bela princesa num reino distante que encontrou seu príncipe encantado e apenas viveu com ele feliz por muitos anos? É necessária a existência de uma bruxa, de um dragão, de um gigante ou de um ogro ao menos!
Porém a própria vida sempre se incumbe de fazer cruzar nossos caminhos com o de algum destes monstros arquetípicos e não me parece nem um pouco necessário que nós aumentemos tanto assim a população desses "bichos papões". Ainda hoje me perguntaram o que eu considero "perversão". Minha resposta foi que perversão é torturar gente nas prisões, é lançar aviões repletos de passageiros contra prédios altos cheios de gente trabalhando, é jogar bombas atômicas sobre cidades inteiras, é concentrar a renda mundial para que uma meia dúzia possa andar de iate enquanto milhões morrem à mingua, é inventar e vender drogas psicotrópicas cada vez mais potentes para uma juventude alienada, é ficar contente com uma população imbecilizada porque ela é mais fácil de ser manobrada, é convencer um monte de gente infeliz que ao injetarem substâncias tóxicas e cancerígenas em seus corpos elas serão mais amadas por suas formas pseudo-robustas, é entupir a população com gorduras em excesso e depois torturá-la com cirurgias desnecessárias, é vender sexo no lugar de amor, é destruir um país para surrupiar suas riquezas naturais. Eis os Sete (ou mais) Pecados Capitais em sua roupagem de Século XXI.
O pensamento típico do Mal sempre é "não é comigo, é com ele", "eu vou me dar bem e ele que se dane", "eu quero mais é que ele se ferre", "eu sou superior e tenho direito a usar os que são tolos e se deixam enganar". A única maneira de se resolver tudo isso é mostrar de uma vez por todas a esta espécie degenerada chamada de Ser Humano, que a felicidade já lhe foi dada e está na aceitação de si mesmo, na compreensão de que o Outro tem direito a ela tanto quanto ele, na aceitação das condições da vida, na contemplação da beleza do momento presente e da alegria de viver, no respeito à Criação, na liberdade de expressão, na criatividade e no contato inter-humano. Quando vamos entender que a Humanidade é una e que cada qual é interdependente e o egoísmo obstinado não nos levará se não à auto-destruição? Quando vamos perceber que cada um de nós só é capaz de fazer tanto o Bem quanto o Mal a uma única pessoa na face da Terra: a si próprio! Poderíamos resumir tudo isto em uma única frase: "amai-vos uns aos outros" ou ainda "ama teu próximo como a ti mesmo".
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